Participei, entre os dias 5 e 6 de agosto, da exótica E. T. Full Moon Midnight Marathon, organizada pela Calico Racing, que aconteceu, em Rachel/Nevada, a 2 horas de Las Vegas e ao lado da “alienígena” Area 51. O percurso na “Rodovia Extraterrestre”, nome dado oficialmente pelo governo federal à rodovia 375, tem subidas longas, constantes, de muitos kms e tem um número impressionante de avistamentos de OVNIs relatados. Os corredores das distâncias 51 e 42 kms largaram à meia noite, todos bem-humorados e criativamente vestidos com roupas e acessórios “out of this world”: orelhas pontudas, tiaras com antenas, óculos, máscaras, luzes neon, macacões prateados da Nasa, fantasias de “Guerra nas Estrelas” e todos usavam as obrigatórias lanternas e coletes fluorescentes. Demorei um tempo para acostumar-me à completa escuridão, quando largamos à meia noite, receava cair porque a visibilidade era muito restrita. Mas o incômodo durou pouco, logo percebi o deslumbrante céu estrelado e que o breu seria a única forma de destacar o brilho das estrelas. Borboletas e outros Insetos procuravam a luz da lanterna de cabeça, um rato cruzou a estrada, ouvi uns sons estranhos da vida selvagem em um arbusto, uma vegetação solta foi soprada pelo vento, naquele silêncio ensurdecedor. Corria contra o vento gélido de uns 12 graus, as mucosas do nariz e gargantas doíam com o clima seco, não conseguia dobrar os dedos, apesar das luvas, mas sorri largamente e esqueci do frio e cansaço da Maratona de San Francisco, 15 dias antes, quando vi uma estrela cadente cortando a escuridão. Corria sem torcida, a maior parte do tempo sozinha ou apenas vendo distante as luzes de outros corredores, então apelei para recursos internos de treino mental e cantarolava as músicas do show de Maroon 5 e do espetáculo tributo a Michael Jackson, feito pelo Cirque du Soleil, que havia assistido dias antes, porque valia qualquer coisa para espantar o sono. Cruzei com Ivan, que fazia os 21 kms e comentei que só havia encontrado o tapete da largada e nenhum outro, nem alguém fiscalizando, só a placa sinalizando que deveríamos retornar daquele ponto. Deveria ser assim, em qualquer cultura. Sentia fome porque jantei cedo e o restaurante da largada estava fechado e não encontrei nada nos postos, a cada 3 milhas, além de água e isotônico. Cheguei ao km 32 e não me foi oferecida uma sonhada brasileiríssima banana, mas a voluntária perguntou-se se eu tinha visto o sol nascendo e surpresa, disse a ela que ainda demoraria muito porque olhei tudo ao redor e só vi escuridão, sem nem ao menos identificar onde era o Leste. Ela, em silêncio, apontou o “sunrise” e fiquei boquiaberta com a beleza do que vi: o suave contorno das montanhas que cercavam o lugar foi destacado, a vegetação desértica podia ser melhor vista, as cores do lugar ficaram mais vivas e era tudo mais bonito do que eu imaginava. Agradeci-lhe o presente que ela me deu e aprendi a lição de ficar mais atenta às sutis nuances do que me cerca. Olhava para o lado direito e era noite escura, já do lado esquerdo, o dia surgia, timidamente. Deixei de correr para não perder a ótima sensação e deslumbrava-me com o momento. Cada vez mais, corro anti-contra-relógio, my race/my pace. Vi de longe um rapaz de Los Angeles, que havia nos oferecido frutas na largada, quando ouvíamos uns corredores tocando violão e pendurávamos o número de peito porque o kit só foi entregue na largada. Gritei: só faltam 2 kms e a medalha está esperando por nós; ele voltou a correr, demos um tiro como se a nave espacial que trouxe ao Planeta Terra, o E. T. Nilson Lima, estivesse nos perseguindo, para nos abduzir, e cruzamos juntos a linha de chegada, rindo muito. Havia um farto café da manhã servido, pendurei a medalha da minha 53ª Maratona, em forma de alien no pescoço, ganhei uma lanterna potente porque fiquei em 1º na categoria idade e 28ª geral/77, agasalhei-me e entrei no busão que tocava rock alto, repleto de corredores gringos animados, guiado pelo jovem motorista de longos cabelos louros que vestia uma camiseta escrito: Humans are real! Olhei ao redor, para aqueles corredores que, como eu, pareciam ter a sensação de que, heroicamente, haviam conquistado seu próprio mundo, entre as linhas de largada e chegada, e constatei que acreditava no mesmo que aquela camiseta defendia.

Vanusa Barreira

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