Maratona de Londres
por: Daniel Azadinho
A aproximação ao pórtico de chegada da maratona de Londres estava a apenas 400 metros à frente.
Após quase longos 42 km percorridos a uma velocidade média de 11 km/h, só havia a última curva à direita do percurso, seguida de uma pequena reta.
A essa altura os atletas apenas querem e sonham em cruzar a linha de chegada, estejam inteiros, machucados, impossibilitados, destruídos, lesionados ou mesmo mortos.
Nessa hora alguns corredores, como eu, ensaiam gritos de vitória e fúria, coreografias, e simulam chegadas voando ou com os braços para o alto.
Mas foi exatamente a partir da última curva à direita do trajeto da maratona que nada disso aconteceu.
Pensava em chegar gritando (como forma de desabafo pelo sucesso de completar a décima maratona da vida, dentre elas as “six majors”), fazendo o famoso “aviãozinho”. Mas não.
Protagonizei algo surpreendente, que serviu como lição pra levar pela vida inteira.
Vinha eu acelerado na referida última curva, com empolgação, quando deparei à minha frente com uma corredora francesa, de 54 anos de idade.
A colega aparentemente estava muito mal, com o corpo desequilibrando para o lado esquerdo, prestes a sofrer uma violenta queda, o que poderia machuca-la, e muito.
Ao vir aquela cena, corri em direção a ela para socorrê-la.
Quando segurei a mulher para não deixá-la cair ao chão, ela, então se sentindo acudida, desfaleceu momentaneamente em meus braços.
Nesse momento pedi ajuda a um fiscal da prova, mas a mulher gritou dizendo que queria cruzar a linha de chegada.
Ao ouvir aquilo prontamente segurei os braços de minha colega de corrida, e disse-lhe que iria ajudá-la a cruzar a linha de chegada, mesmo que fosse carregada.
Nesse momento ela esboçou um sorriso radiante e de alívio.
Por uma agradável coincidência, outro colega corredor brasileiro viu o que acontecia, e veio imediatamente em meu auxílio.
Pronto.
Passamos a carregá-la pelos braços, um de cada lado, a passos bem desacelerados.
Com cuidado fomos conduzindo aquela corredora francesa, estando ela praticamente impossibilitada de completar um único passo em linha reta.
De repente, ao acompanharem aquela cena, a multidão que assistia a corrida passou a aplaudir e a gritar palavras de incentivo e força para a corredora, o que também empolgou eu e meu colega.
Logo estávamos todos empolgados e emocionados com o que estava acontecendo.
A essa altura, os nossos tempos pessoais previstos para acabar a maratona já tinham ido pro “saco”, porque para nós, o que realmente importava naquela situação, era ajudar aquela francesa a cruzar a linha de chegada e a completar a maratona.
Pois o mesmo sonho dela era o meu e o do meu colega!!!
Devagar conseguimos cruzar o pórtico de chegada, e todos completamos a maratona, sob os gritos ensurdecedores da torcida.
Os agentes médicos, que já estavam acompanhando de longe a saga e façanha daquela guerreira, já se prontificaram na linha de chegada pra darem os primeiros socorros àquela mulher.
A lição que levo dessa história é a de que “na vida vale muito mais a pena você deixar de realizar uma vontade ou desejo seu em um determinado momento, para, primeiro, socorrer um próximo que tem a mesma vontade e desejo que o seu,
mas que está na iminência de não alcançá-los por alguma razão qualquer do acaso”.
Olhar pelo retrovisor a queda e o tombo de um ser humano, distante ou próximo, sem retornar para estendê-lo mão quando possível, representa a mais sórdida atitude do egoísta.
Vencer é sempre muito bom, mas ajudar alguém a vencer e a realizar os seus sonhos ao teu lado é bem melhor, espetacular e incomensurável!!!
Agradeço a Deus por ter me escolhido para protagonizar essa história.